Reclusos definham por falta de comida na cadeia do Uíge

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O rapaz na fotografia é Pedro Bambe, e tem 16 anos de idade. Foi condenado há três anos de cadeia por assalto a mão armada pelo tribunal provincial do Uíge. Já cumpriu um ano.

Por Sedrick de Carvalho

Também conhecido como «Avô Demónio», o rapaz sente o peso da justiça pelo caminho criminoso que enveredou. Porém, não só a mão pesada da justiça. A falta de comida na cadeia é a principal punição para os reclusos, e Pedro Bambe definha aceleradamente, de tal forma que os companheiros de cativeiro não acreditam que sairá vivo dali.

Para uns, Pedro Bambe, ainda mais com a alcunha que tem, merece mesmo estar na cadeia e comer o pão que o Diabo amassou. Só que, ali, nem o pão que o Diabo amassou tem, e isto certamente ele não merece. Ninguém merece. É contra os Direitos Humanos, contra a humanidade.

Mas a direcção nacional dos Serviços Prisionais continua a acreditar que nem pão os reclusos merecem, e não os dá. Muitos ainda estão vivos por favores sexuais e trabalho escravo internamente.

Muitos são os reclusos que estão em condições de cumprirem o resto da pena em liberdade condicional, alguns de gozarem licenças mediante passes, nos termos da lei penitenciária, mas a ausência de sentenças inviabiliza tal procedimento. A maioria dos presos no Uíge foram condenados pelo tribunal provincial de Luanda, e é este tribunal quem mais demora a enviar os acórdãos de sentenças dos presos.

Um dos presos, condenado há 12 anos e que já cumpriu seis, contou-nos que a sua família já fez o pagamento das respectivas multas e custas judiciais, mas não usufrui da liberdade condicional por faltar a indispensável sentença. Não está a definhar por receber visitas da esposa que sempre o aguarda para recomeçarem a vida – o eterno recomeço.

Se uns têm, Pedro Bambe não tem qualquer apoio familiar. E sua família reside mesmo no Uíge.

A falta de assistência médica e medicamentosa é outra razão para os presos chamarem o local de «O inferno», não de Dante, mas do governo angolano. O posto médico não tem materiais, desde luvas aos medicamentos. Se algum recluso é levado para os hospitais do Uíge-sede ou do Negage, em casos extremamente graves que chocam a sensibilidade de algum agente de serviço, é o mesmo agente o responsável por pagar as despesas do doente. Por permitir esses actos de caridades, o director da cadeia é classificado como «boa pessoa», e os presos apontam a direcção nacional como a responsável pelo que ali se passa.

A cadeia chama-se Kindoki e tem mais de 500 presos, pouco comparando com os números das cadeias de Luanda. Ainda assim, a péssima gestão é semelhante a feita em todas do país.

“O senhor director nacional nada faz porque em Angola não há direitos humanos”, disse-nos outro recluso, que admitiu que começou a ganhar consciência do verdadeiro estado do país na cadeia.

Em Março, uma delegação de candidatos a deputados pelo círculo provincial do MPLA se deslocaram até lá em visita. Menosprezaram o facto de que muitos reclusos têm os ossos expostos à pele como se fossem esqueleto humano numa aula de anatomia, classificando de “algumas dificuldades” a grave falta de alimentação e medicamentos. À ANGOP, elogiaram “os esforços envidados pelo governo angolano […] que permitiram uma nova e moderna cadeia […] com melhores condições de acomodação à população penal”. Ou seja, o MPLA aposta na construção de cadeia para aprisionar as vítimas da sua má governação e “revús”, mas não se importa em alimenta-los e garantir a assistência médica. E, no âmbito de “melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”, há uma certeza: vão apostar na construção de mais cadeias e menos hospitais, escolas e empregos.

Radio Angola

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