Relatório dos EUA sobre Liberdade Religiosa em Angola no ano de 2020

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A constituição Angolana define o Estado como sendo laico, proíbe a discriminação religiosa e prevê o direito à liberdade de consciência, religião e culto.

Rádio Angola

A lei exige que as organizações religiosas obtenham o reconhecimento do Estado, através do cumprimento de determinados critérios legais e permite que o Estado encerre as instalações de organizações religiosas não registadas.

Existem 81 organizações religiosas reconhecidas pelo Estado e mais de 1,100 organizações religiosas não reconhecidas. Desde 2004, o Estado não reconhece nenhuma organização religiosa nova.

Em Março, o Estado procedeu à detenção de mais de duas dezenas de líderes religiosos e crentes em várias localidades, por violação à proibição de grandes aglomerações, devido à pandemia do COVID-19.

Em Abril, as organizações religiosas formaram um grupo de trabalho ecuménico em assistência aos esforços do governo no combate à pandemia do COVID-19. Em Setembro, o Estado emitiu um decreto que estipula que apenas as organizações religiosas legalizadas podem realizar serviços de culto, ainda que de forma limitada, no quadro das restrições devidas à pandemia.

Ainda em Setembro, líderes da comunidade Islâmica reagiram, afirmando que tais restrições constituem uma violação aos seus direitos constitucionais. Subsequentemente, o Estado liberalizou as restrições religiosas, de modo a acomodar a celebração da Sexta-Feira Islâmica.

Em Junho, líderes da filial Angolana da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) separaram-se da liderança Brasileira da IURD, o que resultou em processos judiciais de uma contra a outra parte, e o arresto por parte das autoridades, de sete templos da IURD, sob a acusação de fraude e outros crimes de natureza fiscal, de acordo com a imprensa internacional.

Durante o ano, funcionários da embaixada dos E.U.A, abordaram, junto das autoridades Angolanas, várias questões relativas à liberdade religiosa, incluindo o encerramento de locais de culto em 2019, as restrições devidas à pandemia, a morosidade nos processos de solicitação de registos e a implementação da lei sobre a liberdade religiosa.

Os funcionários da Embaixada tiveram como interlocutores, representantes de organizações religiosas e da sociedade civil, em todo o país, tendo abordado o problema prevalecente do reconhecimento das organizações religiosas, a cisão na Igreja Universal do Reino de Deus e o efeito das restrições devidas à pandemia, sobre a capacidade de se exercer o culto livremente.

Artigo I. Demografia Religiosa

O governo Americano calcula a população Angolana em 32,5 milhões (estimativa de meados de 2020). De acordo com o censo populacional de 2014, que constituem os dados mais recentes disponíveis, aproximadamente 41 porcento da população processa a religião Católica Romana e 38 porcento, a religião Protestante. Doze porcento da população é constituído por pessoas que não processam qualquer religião.

O restante 9 porcento é constituído por animistas, muçulmanos, judeus, Bahas e outras organizações religiosas. Embora o censo de 2014 tenha determinado a existência de 103,000 muçulmanos no país, o líder de uma organização islâmica afirmou existirem cerca de 800,000, incluindo um número desconhecido de migrantes Muçulmanos, a maioria dos quais provenientes de países da África do Norte e Ocidental. Existem aproximadamente 350 judeus, a maioria dos quais na qualidade de estrangeiros residentes.

Artigo II. Situação Actual do Respeito do Estado à Liberdade Religiosa

Quadro Jurídico

A constituição define o Estado Angolano como sendo laico e proíbe a discriminação religiosa. A constituição determina que as igrejas e demais organizações religiosas sejam protegidas pelo Estado desde que as mesmas estejam em conformidade com a lei.

A constituição prevê o direito à liberdade de consciência, crença religiosa e de culto e reconhece o direito das organizações religiosas de realizar as suas actividades desde que as mesmas estejam em conformidade com a lei.

A constituição permite a objecção de consciência por razões religiosas, proíbe o questionamento à pessoa humana sobre as suas crenças religiosas, excepto por motivos de recolha de dados estatísticos e estipula que os direitos religiosos não podem ser suspensos, mesmo na eventualidade de declaração de estado de guerra, sítio ou de emergência.

Ela reconhece o direito aos reclusos de receber visitas e de se corresponderem com conselheiros religiosos. A lei estipula que os objectores de consciência podem realizar serviço civil, como alternativa ao serviço militar.

A lei determina que as organizações religiosas estejam registadas a fim de serem reconhecidas pelo Estado e permite ao Estado encerrar organizações religiosas não registadas.

O reconhecimento legal habilita as organizações religiosas a adquirirem propriedade e a utilizarem tal infra-estrutura para a realização de eventos religiosos, isenta-as do pagamento de determinados impostos prediais e direitos de importação e autoriza que as organizações religiosas tenham o estatuto de sociedade comercial, em termos judiciais.

A lei determina a apresentação de 60,000 assinaturas de membros, na qualidade de residentes legais, como requisito para o registo, das quais, 1,000 assinaturas têm de ser provenientes de membros residentes em cada uma das 18 províncias. Tanto a assinatura como a declaração de residência de cada membro devem ser reconhecidas por notário.

A lei exige que as organizações religiosas apresentem documentação que determine a sua estrutura organizativa, localização, métodos e horário de culto, recursos financeiros e os projectos de obras em vista. A lei estipula ainda os requisitos de qualificação para o clero e determina que a doutrina religiosa esteja em conformidade com os princípios e direitos estabelecidos na constituição.

O Ministério da Cultura, através do seu Instituto Nacional dos Assuntos Religiosos (INAR), é a entidade encarregue do processo de registo e da supervisão das actividades religiosas. O INAR, que é chefiado por um ministro religioso, presta assistência às organizações religiosas no processo de registo e analisa as doutrinas religiosas de modo a garantir que estejam em conformidade com a constituição.

A instrução religiosa não faz parte do currículo académico estatal. O ensino privado tem autorização para leccionar disciplinas de carácter religioso.

O país é membro da Convenção Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.

Práticas do Governo

Em Março, a polícia deteve vários líderes religiosos e crentes por violação ao decreto sobre o estado de emergência que proibia as grandes aglomerações, como medida de prevenção à disseminação da pandemia do COVID-19.

De acordo com relatos da imprensa, a polícia deteve mais de duas dezenas de pessoas por organizarem e participarem em ajuntamentos de natureza religiosa: pastores da Igreja Adventista do 22º Dia no Bié, Huambo, Benguela e Lunda Norte; quatro membros da Igreja Congregacional Evangélica no Cuanza Sul e um pastor da Missão Evangélica do Espírito Santo no Namibe.

Vários líderes religiosos criticaram as acções dos pastores e afirmaram que as igrejas devem cumprir com as restrições impostas pelo Estado. A chefe do Conselho das Igrejas Cristãs de Angola, Deolinda Teca, afirmou que as pessoas devem continuar a participar nos cultos, mas em estrita observância às medidas de segurança impostas pelo Estado e deploraram a postura de alguns líderes religiosos os quais, nos primeiros dias da vigência do estado de emergência, continuaram a realizar cultos com a participação de um elevado número de crentes, apesar das restrições devidas à pandemia.

Em Outubro, o Estado emitiu um decreto que estipula que apenas as organizações religiosas formalmente reconhecidas pelo Estado estavam autorizadas a retomar os cultos, mas, de forma restrita devido às medidas de restrição da pandemia.

No mesmo decreto, definia-se ainda o Sábado e o Domingo como os únicos dias da semana para a realização dos cultos. Os líderes da comunidade Islâmica protestaram, afirmando que os dias definidos não levaram em consideração a sua religião.

O decreto, actualizado de 30 em 30 dias, foi alterado em Novembro, de modo a permitir o culto aos crentes de Sexta-Feira, sem especificar a fonte das objecções. Na prática, e de acordo com membros de organizações religiosas, a proibição sobre as organizações religiosas não registadas não foi implementada.

Após a aprovação da lei em 2019 que reduziu o número das assinaturas dos membros para fins de registo, para 60,000, mas introduziu o requisito de 1,000 assinaturas de cada uma das 18 províncias, tendo dado às organizações não registadas, o prazo de seis meses para cumprirem com tal requisito, as organizações religiosas não registadas declararam que o prazo estipulado é demasiado curto e que os requisitos relativos à autenticação por notário e a declaração de residência, que os mesmos calcularam em cerca de $7,50 por assinatura, são demasiado onerosos e constituem um enorme encargo para as suas congregações.

Para além do requisito da assinatura, a existência de um elevado número de residentes sem documentação e as falhas no sistema de registo residencial também constituem obstáculos ao registo, de acordo com os líderes das organizações religiosas.

Apesar da lei estipular que o Estado pode encerrar as actividades das organizações religiosas que não cumpram com os requisitos, funcionários do Estado informaram aos líderes religiosos que a implementação de tal medida iria ser adiada até à publicação de nova regulamentação por parte da presidência da República.

No final do ano, as organizações religiosas que haviam iniciado o processo de registo, mas cujo processo ainda não havia sido aprovado pelo Estado, incluindo os Muçulmanos e os Bahas, foram autorizadas a realizar cultos, desde que em conformidade com as restrições impostas devido à pandemia.

O director do INAR e funcionários do ministério da Cultura continuaram a manifestar preocupação relativamente à proliferação de “seitas” religiosas, algumas das quais tendo alegadamente explorado pessoas vulneráveis e com parcos recursos financeiros, exigindo que as mesmas façam contribuições ou o pagamento recorrente de quotas pela participação nos cultos ou pela filiação a tais organizações.

O Estado continuou a não reconhecer qualquer organização Islâmica ou emitiu qualquer licença para organizações islâmicas praticarem legalmente a sua religião. A solicitação para o reconhecimento oficial foi apresentada em 2019 por duas organizações Islâmicas, a CISA (Comunidade Islâmica de Angola) e a COIA (igualmente conhecida como Comunidade Islâmica de Angola) continuou pendente.

No passado, funcionários do Estado declararam que algumas práticas permitidas pelo Islão, tal como a poligamia, contradizem a constituição Angolana. De acordo com o COIA, existiam 69 mesquitas não registadas no país.

A Fé Baha e a Igreja Messiânica Mundial permaneceram as únicas organizações não cristãs legalmente registadas antes da lei de 2004.

Durante o ano, a estação de rádio Católica, rádio Ecclesia, expandiu a sua emissão para 16 províncias, a seguir ao anúncio de um decreto presidencial em 2018 em que o Estado permitiria a extensão do sinal da mesma rádio para além da província de Luanda. No país, funcionam igualmente estações de rádio pertencentes às igrejas Metodista, Evangélica e Tocoísta (também conhecida como Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo no Mundo).

Artigo III. Situação do Respeito da Sociedade à Liberdade Religiosa

Em Abril, as organizações religiosas formaram um grupo de trabalho ecuménico no sentido de aconselhar o Estado nos seus esforços de combate ao COVID-19. Representantes das Caritas, do Conselho das Igrejas Cristãs em Angola e da igreja Nosso Senhor Jesus Cristo no Mundo, trabalharam em conjunto no sentido de identificar comunidades vulneráveis e coordenar a assistência junto das entidades do Estado. O grupo de trabalho prestou maioritariamente apoio relativamente às restrições impostas pelo Estado aos ajuntamentos públicos, instando as organizações religiosas a cumprirem com as restrições impostas devido à pandemia.

Em Outubro, uma sondagem realizada pela rede de pesquisa independente, Afrobarometer, constatou que as populações rurais e outras em locais isolados, dependiam mais dos líderes religiosos, autoridades tradicionais e das forças armadas, na transmissão de informação relativa ao COVID-19, relativamente a outras fontes, incluindo funcionários do Estado.

Em 23 de Junho e de acordo com notícias veiculadas nas redes sociais, um grupo de pastores locais da IURD, assumiu o controlo de alguns dos 230 templos da IURD no país, após acusarem a liderança Brasileira da IURD de “racismo e hostilização”, transferência ilícita de moeda estrangeira, e venda ilícita de bens da igreja.

Após uma série de acusações mútuas, líderes locais e Brasileiros moveram acções judiciais entre si. Com início em Agosto, a PGR arrestou 36 templos da IURD por suspeita de fraude fiscal e branqueamento de capitais. Em resposta à solicitação feita pelo presidente Brasileiro no Twitter no sentido da intervenção do Estado Angolano, um porta-voz do governo Angolano afirmou que o litígio seria resolvido judicialmente e não por via diplomática. No final do ano, todos os templos da IURD se encontravam encerrados, estando o processo judicial pendente.

Artigo IV. Política e Engajamento do Estado

Durante o ano, funcionários da embaixada dos E.U.A. reuniram com entidades do Estado, líderes religiosos e da sociedade civil, incluindo representantes das comunidades Cristãs, Islâmicas e Judaicas.

Durante o diálogo bilateral anual sobre os direitos humanos realizado em Dezembro, funcionários dos Estados Unidos instaram o governo Angolano no sentido de resolverem a questão das violações cometidas por organizações religiosas juridicamente e encorajaram o Estado a facilitar os requisitos de registo para as organizações religiosas.

Funcionários da embaixada reuniram igualmente com representantes em várias províncias, incluindo Luanda, Benguela, Huíla e Cunene, bem como com representantes de vários grupos e organizações religiosas tal como a Congregação das Igrejas Cristãs em Angola, Tocoístas, a Ordem dos Pastores Evangélicos de Angola, os Serviços de Refugiados Jesuítas, a COIA e o grupo Judeu, Chabad-Lubavitch. Os tópicos abordados centraram-se no reconhecimento às organizações religiosas, a cisão na IURD e o efeito das medidas de prevenção ao COVID-19 sobre as organizações religiosas.

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