CAMPO DA MORTE: CASO N.º 33: OS IRMÃOS DOMINGO E O MATADOR DE NADA

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VÍTIMAS: Irmãos António Domingos “Tony”, 20 anos, e Ernesto Sapalo Domingos “René”, 18 anos, naturais do Huambo; Mais dois jovens identificados apenas como sendo residentes do município do Cazenga

DATA: 18 de Novembro de 2016

LOCAL: “Campo da Morte”, bairro 6, município de Viana

OCORRÊNCIA:

Três dias antes, a 15 de Novembro, por volta das 22h00, os irmãos confraternizavam na rua com os amigos, quando foram detidos. “Os vizinhos testemunharam a detenção dos meus irmãos por elementos do SIC, que vestiam coletes [de identificação] e se faziam transportar num Toyota Land-Cruiser branco”, revela o irmão mais velho, Alberto Domingos.

Logo após a detenção, Alberto passou pelas esquadras de Viana à procura dos seus entes queridos, sem sucesso. “Fomos à Esquadra do Mirú e disseram-nos para irmos ao Comando Municipal de Viana. Chegados lá, disseram-nos que não sabiam de nada”, recorda.

Alberto estava a trabalhar quando, por volta das 14h30, recebeu telefonemas de vizinhos a informarem-no de que os seus irmãos tinham sido fuzilados minutos antes no ora conhecido “Campo da Morte”. Correu para lá.

“Como somos conhecidos no bairro, as testemunhas informaram-me de que os meus irmãos tinham sido levados para o campo num Toyota Land-Cruiser branco, junto com outros dois rapazes. Havia quatro agentes vestidos com os coletes azuis da DNIC [SIC]. Mandaram-nos descer um por um da viatura, com os olhos vendados, e obrigaram-nos a correr”, conta.

“Eram abatidos mal desciam do carro, com todo mundo a ver, mesmo ali junto à escola e com o sol aberto. Estavam de tronco nu. O Tony foi atingido com dois tiros. Um na cabeça e outro nas costas. O Ernesto virou-se para ver os agressores e levou quatro tiros no abdómen”, descreve o irmão.

Os dois desconhecidos foram assassinados com dois tiros nas costas cada um. Em menos de 15 minutos, chegaram ao local as viaturas de recolha de cadáveres, com efectivos da Polícia Nacional. Estes ali se mantiveram até às 19h00, impedindo que os familiares se aproximassem das vítimas enquanto prolongavam a exibição dos mortos.

Alberto Domingos refere que o chefe de missão dos assassinos, e um dos principais executores, é bem conhecido no bairro. “Ele é afamado como o De Nada. Primeiro, era colaborador do SIC, agora é agente de campo colocado na Esquadra do Mirú”, revela.

Os irmãos ficaram órfãos de pai muito cedo e, há três anos, perderam a mãe. “Os meus irmãos não eram de mexer [roubar]. Eu cuidava deles. Era eu quem os sustentava”, afirma, acrescentando que “nunca tiveram problemas com a justiça”. “Se calhar foram apenas confundidos”, remata, como se se tratasse apenas de um caso de má-sorte.

Testemunhos presenciais corroboram a versão apresentada por Alberto Domingos.

 

Fonte: «O campo da morte – Relatório sobre execuções sumárias em Luanda, 2016/2017», Rafael Marques de Morais

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