BENGUELA: INTOLERÂNCIA POLÍTICA CRÓNICA NO BOCOIO

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Em 2017, no dia 23 de Agosto, dia das eleições, Augusto Tchavala Tchombola, soba da aldeia de Longanga, mandou Paulino Tchombola chamar José Praia. Desde aquele dia que José Praia continua desaparecido. Apenas apareceram os seus chinelos perto. O soba Tchavala Tchombola, militante do MPLA, não confirma se o seu camarada do partido José Praia atendeu ao convite naquele dia. A Polícia Nacional acusa Xavier Kahinde pelo desaparecimento de José Praia. Quem é Kahinde? É assim que começou mais um problema político em Bocoio, município da província de Benguela, bastante conhecido pelos actos de intolerância política.

Texto de Pinto Muxima | Bocoio

Xavier Kahinde é militante da UNITA. No dia 22 de Agosto de 2017, enquanto delegado de lista eleitoral do seu partido, passou a noite no Lohombo, a localidade onde estava destacado. No dia seguinte, 23, não conseguiu ir à sua casa porque tinha de levar os resultados eleitorais obtidos na sua assembleia de voto ao comité comunal da UNITA no Cubal do Lumbo. E assim procedeu.

É esse o álibi de Xavier Kahinde, e por isso “não faz sentido acusa-lo de autor do desaparecimento de José Praia”, dizem alguns moradores do Bocoio.

Mais de um ano depois, concretamente a 15 de Outubro de 2018, um caçador encontrou os restos mortais identificados como os de José Praia pela polícia local. Entretanto o acusado pelo desaparecimento já tinha ficado 14 dias na cadeia municipal do Bocoio, e quando foi libertado não lhe informaram se estava acusado, portanto não estava.

O início de 2019 devolveu Kahinde à cadeia. Em Janeiro foi “raptado” na comuna da Canjala, município do Lobito, sem lhe ser exibido qualquer documento que atestasse a necessidade de ser detido. Transferido para o Bocoio, Kahinde foi submetido a um interrogatório de 24 horas na esquadra da comuna do Passe. Depois foi enviado para a cadeia da Catumbela, e dali só saiu passadas 24 horas, também sem ser acusado formalmente.

Porém, nunca foram chamados à esquadra os militantes do MPLA que no dia 23 de Agosto teriam estado com José Praia, nomeadamente o soba Augusto Tchavala Tchombola e o seu emissáio Paulino Tchombola, nem o proprietário da casa onde foi encontrado os chinelos.

O foco da investigação levada a cabo pelo SIC está direccionado ao militante da UNITA. Nesse mês Kahinde foi notificado pela primeira vez para comparecer à esquadra comunal do Cubal do Lumbo. Os seus companheiros do partido ficaram enfurecidos e levantaram-se “em peso para ir ao encontro do comando comunal da polícia” dispostos a serem detidos também em solidariedade ao “maninho”. Antes passaram pela sede comunal do partido onde perguntaram ao secretário o que achava da iniciativa. O secretário comunal, Manuel Palanga, criticou a ideia, garantindo que ele mesmo iria reunir-se com a administradora comunal, Maria de Fátima Alberto, também primeira secretária do MPLA na localidade, a mesma que pouco antes ameaçara os militantes da UNITA.

Enquanto Xavier Kahinde e mais 21 companheiros conversavam às portas da sede do partido, viram-se cercados por militantes do MPLA provenientes da povoação da Balança, que fica 14 quilómetros a norte da sede municipal do Bocoio. Em reacção à provocação, uma luta entre militantes dos dois partidos começou imediatamente. Foram destruídas motorizadas e a polícia teve de intervir, mas enquanto disparos eram feitos ao ar para dispersar a luta, os membros do MPLA “aproveitavam fazer mais estragos”.

Dentre os membros do MPLA que orientavam a acção foram identificados: Miguel Mariano Supo, Nhama, Kulembe Ti-Kali, Zé Kakutu, Bernardo Kulala –Moli, Paulo Lupili, André Katoto, Rosa.

Houve sete feridos, todos eles da UNITA. Dois porcos foram mortos a paulada e doze motorizadas destruídas. A sede da UNITA ficou sem porta e janelas, entre outros materiais partidos.

Mas não foi tudo. Às 0H um agente da polícia fez um disparo contra um jovem de 23 anos de idade, identificado como Mateus Katanga Solano, também pertencente ao partido UNITA, tendo sido atingido no abdómen e braço esquerdo. Segundo vizinhos e familiares, Mateus não participou na luta entre partidos.

“Ele chegou na hora em que os confrontos já tinham terminado”, contaram. Foi baleado quando saia duma loja onde foi comprar algo, tendo sido atingido com duas balas no abdómen e outra no braço.

Suspeita-se que os disparos tenham sido feitos por um agente da Policia Nacional “porque é a única que estava próximo com armas”, mas os moradores desconfiam também que seja um civil. Imediatamente foi levado ao posto médico próximo e ali assistido.

A polícia confirmou que as balas disparadas pertencem à corporação, entretanto não foi detido ninguém até ao momento.

 

REUNIÃO ENTRE ADMINISTRAÇÃO E PARTIDOS

As entidades políticas e governamentais do município tomaram conhecimento e acharam que era necessário reunirem todos juntos numa comissão de pacificação das duas partes. Onde passaram o dia todo resolver a situação.

Triste e lastimável é o modo como os seguranças e polícias impediram que os jornalistas fizessem parte do encontro que tiveram. “Onde não há acesso à comunicação social não há democracia. Uma nação sã não reprime jornalistas porque estes fazem parte de democratização de qualquer país. Entende-se que existe segredos na parte do Estado e não querem que o mundo saiba da situação que enferma aquelas populações. Se formos a continuar a trabalhar assim nunca teremos um país com liberdade de expressão e onde não há liberdade de expressão há escravatura. A democracia não pode findar nos papéis”, lamentaram os jornalistas.

A comuna do Cubal do Lumbo dista a 31 Km a norte do município do Bocoio, província de Benguela, com 785 Km2 de superfície.

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